domingo, 19 de dezembro de 2010

Te sorvo como um licor...

Tu és um licor de pimenta...
te sorvo - me embriagas, me aquece o corpo e a garganta e me conforta...
Mas depois... me ataca forte as hemorróidas...

Riaccende

Como pode? Num dia não te conheço, 
noutro não te esqueço.
Em poucas palavras explica o mundo 
e reacende 
o que já hibernava tão profundo.
Uma vontade que se achava quase morta
e na turva visão de quem morre, 
enxergava tudo certo nestas linhas tortas.
Sim, ressurge a esperança, 
mais que isso, a certeza,
que pode ainda nessa humanidade
haver um pouco de beleza...

Passo pra trás

Pisoteio minha vida num passo errôneo para trás.
O que devia ser apenas uma figura fria ressurge e se refaz.
Imaginei que a antiga harmonia não existiria mais,
só que tudo se transforma e se reforma.
E aquela agonia logo se desvia e se desfaz...

Paternidade

E o céu disse: -É à mim que devem eles obediência.
E o mar não consentiu: -De ti não obedecem nem mais os limites.
O céu em sua fúria esbraveja: -Raios e trovões, quem nesse mundo nunca bebeu de minha água que se pronucie.
-A água que carregas é apenas vapor, não passa de nuvens passageiras.
O céu se fecha enfurecido com chuvaradas e vendavais.
O oceano abre um breve sorriso e comenta: -Sabes que tua fúria me atinge somente a superfície,
e sabes que no fundo estou em paz com minha verdade. Não importa que nem todos saibam,
mas fico tranquilo pois tenho certeza, que à mim, um dia todos voltarão...

Torre dos sinos

Surge nos céus um Império decaído
em seus símbolos sujos de sangue e corrupção,
sob um teto de mentiras e joguetes.
Um dia se elevaste imponente aos céus.
Oh! Grande Império...
mas há muito caíste
e hoje observo, com desgosto
e desprezo, tuas vergonhosas ruínas...

De que adianta...

De que adianta ter todas as respostas do mundo na ponta da língua se todas estão erradas?
E você sempre se gabou de seu conhecimento e seu comportamento. E o que fazes agora?
Trilhas teu caminho, mas destrói a própria estrada.
Cria em ti um mundo de extremos, decides entre cara e coroa e se perde num estreito horizonte de cabresto.
Trata como infinito o que há de ser breve.
Numa manhã de Sol, se queixa do burburinho dos passarinhos...
em uma gota de orvalho já enxerga a neve...

Desgosto de ter gasto em seu gosto

Um dia recebestes amor maior do que merecias,
e eu que te dei... e te dei mais do que podia.
Te dei canções, te dei sorrisos, te dei poesias
e te dei as lágrimas que salgaram o travesseiro ao seu lado.
As canções que você pedia que eu silenciasse,
os sorrisos que amarelavam esperando sua resposta,
as poesias que mofavam no canto em que as jogava
e o travesseiro, que tu reclamavas que eu havia sujado...

Conto Natalino: Piscam as Luzinhas de Natal (AVISO DE GATILHO)

AVISO DE GATILHO - Aborda depressão profunda

Piscam as luzinhas de Natal; a noite é quente e agradável; nada de neve caindo - o hemisfério norte é muito longe daqui.
As pessoas caminham com alegria pelo calçadão - seria pela noite estrelada e sua confortável temperatura? Seria pelas férias que estão por chegar para a maioria dos diariamente suados trabalhadores? Seria pelo grandioso espírito natalino que estampa bom humor e boa educação nos rostos diariamente carrancudos? O por quê não importa tanto, o importante é a agradável aura que domina as ruas.
Porém, caminhamos entre homens e nem todos têm o mesmo sentimento, nem todos têm as mesmas oportunidades e nem todos têm o mesmo capital.
A noite está realmente confortável, caminham pelas ruas os jovens, os mais velhos, famílias, casais e todos admiram as luzes de Natal. Entre eles surpreende um rosto carrancudo, que permaneceu por um longo tempo diariamente de bom humor e bem educado, porém eventualmente as competições se acirram e alguns caem - outros despencam; e despencam anos de preparação e dedicação, despencam os amores, muitas vezes perdidos em busca do topo; despenca uma vida inteira.
Piscam as luzinhas de Natal e naquele rosto trombudo iluminam e se apagam na amargura dos rudes traços. Tocam as canções natalinas, que bela é a noite, que noite feliz. Os anjinhos e suas harpas, as renas de nariz vermelho, os algodões espalhados como neve (-patéticos), a solidariedade, a compaixão e o amor (-efêmeros como flores do deserto).
Piscam as luzinhas de Natal; as pessoas caminham com alegria, escutando as canções natalinas, maravilhadas com a noite tão serena e bela; então o carrancudo olhar solitário paira sobre famílias felizes e pára no ar - é de conhecimento que as épocas de maior alegria geral são as épocas de maior tristeza individual; é engraçado o ser humano, que em momentos de alegria não se importa com o tristeza dos outros e em momentos de tristeza deseja ver aos outros tristes também.
Piscam as luzinhas de Natal; acima de uma janela sete anjinhos tocam suas trombetas, mas as canções natalinas ganham soar fúnebre e as estrelas caem do céu, na forma de fulminantes rajadas de aflição.
Piscam as luzes da Morte; pessoas caem pelas ruas; a noite é agradável e quente, quente como o sangue que escorre pelas calçadas; pessoas acompanham as canções natalinas com agudas notas de insegurança e pavor.
O amável espírito natalino desmembra algumas famílias - como aquela criança que destrói, com um sorriso na cara, os seus estimados brinquedinhos, para depois chorar a falta de uma consciência.
A neve de algodão tingida de escarlate combina com a túnica dos afáveis e bons velhinhos espalhados nos enfeites - é a cena do nascimento e do renascimento de um homem respeitoso e solidário, traído por alguns numerários no banco e beijado na testa; um homem que realizou verdadeiros milagres para sobreviver e vendeu seu sangue e seu suor a quem desconhecia. Renasceu ele mesmo como um verdadeiro milagre de Natal e obteve a graça na forma de um conhecimento superior; elevou-se aos céus e despencou sobre o mal um verdadeiro e profundo espírito natalino.
Piscam as sirenes coloridas - ritual que se repete diariamente, mas ganha um interesse especial nesta noite, em que os seus reflexos brilham nos olhos molhados de compaixão...
No dia seguinte, olhares atentos percorrem as bancas de jornal e leem em letras grandes a notícia: JESUS, 33, PROMOVE CHACINA NO CALÇADÃO E SE MATA - é a sua redenção - nunca se vendeu tanto jornal como naquele dia.
E na banca, cravejada de balas, jovens fazem selfies e stories e o comerciante conta seu lucro,
enquanto piscam as luzinhas de Natal...

E se vai...

Que forma tinhas de brilhar,
como era linda tua aura
quando exprimias em seus finos lábios
o sorriso sublime...
Onde está agora
a alegria - que me pulsava o sangue ao te encontrar?
O que nublou o Sol que raiava em teu olhar?
O que desafinou em sua canção?
O que derrubou o teu olhar?
Que antes penetrava com transbordante confiança pelo meu
e o preenchia com alegrar...
Sinto falta daquele teu calor,
que agora esfria e morre, desfalece na minha frente
e não consigo ajudá-la a lutar...
Que a relatividade do tempo seja irrelevante quando ocuparmos o mesmo espaço!